Fome fisiológica e fome emocional: como diferenciar?

Nós, humanos, somos extremamente reativos ao ambiente, recebemos estímulos e pistas ambientais, processamos a informação e respondemos de alguma forma. O grande cerne da questão é que NÃO é possível dissociar emoção de razão e, da mesma forma, não se dissocia alimento de emoção. Comer tem caráter afetivo, comer está atrelado à emoção de qualquer forma, e o ato de ter prazer com o comer é uma resposta afetiva por si só. Quando comemos, temos uma sensação prazerosa. O ponto de análise deve ser justamente em como cada um de nós direciona o ato de comer... O problema começa a ocorrer quando começamos a desenvolver comportamentos compensatórios para tentar anular os efeitos negativos de determinados atos.
Observa-se que há variações na sensibilidade discriminatória, ou seja, há pessoas que tendem a ter uma sensibilidade maior com relação ao apetite e saciedade, e outros que tem uma sensibilidade prejudicada, apresentando, assim, um maior desejo por consumir alimentos por conta dessa excitação prévia que ocorreu diante de determinada emoção.
Mas será que temos como dissociar fome de apetite? Há uma fome que é fisiológica (por falta de energia) e outra fome que é puramente emocional?
Primeiramente, é necessário entender que fome e apetite são coisas diferentes... A fome é caracterizada pela redução energética de estoque, o apetite é uma questão de volição/desejo/vontade.
Sensações viscerais (principalmente localizadas no estômago) tem sim o seu valor, mas não podemos dissociar o estado de fome com o aspecto afetivo da alimentação, há sim um aspecto de desejo envolvido e uma busca por aquilo que confere mais prazer (comida mais gostosa).
Quem tem fome NÃO come qualquer coisa, pois, se tiver como escolher, escolherá provavelmente o alimento de maior palatabilidade. Os aspectos de reforço do comportamento são baseados na intensidade do reforçador em conjunto com o estado do indivíduo...
Por exemplo: se eu tenho fome, e tenho na minha frente 500 calorias de batata com frango com 500 calorias de pizza e estou há muito tempo sem comer/com desconforto grande, irei preferir o mais prazeroso. Em relação ao aspecto afetivo, pode ser composto por gostar (reação hedônica ao estímulo) ou querer (desejo ao estímulo). Os pensamentos relacionados à fome, dor de cabeça, tontura, irritabilidade, falta de concentração, estresse, também são percepções quando o indivíduo está um tempo sem comer.
Todavia, vale ressaltar que essas percepções de fome podem ser influenciadas pelo nível de estresse e pelo tempo que o indivíduo ficou sem se alimentar... Logo, por mais que não tenha ocorrido, de fato, uma queda de energia significativa nesse individuo por ter ficado algumas horas sem comer, ainda assim ele sente esse desconforto de qualquer forma pois ele “rompeu as normas internas dele”. Isso nada mais é do que o cérebro se antecipando para que não ocorra a sensação de escassez, e é por isso que, provavelmente, quando ele vai se alimentar ele acaba comendo mais (não por déficit de energia, mas sim por rompimento de normas).
Dessa forma, é por isso que usar somente os sinais do estômago, para saber se é fome ou não, não é tão confiável. Às vezes, uma percepção de estresse aumentada e um grande tempo sem comer acabam influenciando muito.
Um bom exemplo são as próprias pessoas que foram gastrectomizadas (tiraram o estômago), já que é visto que essas, apesar de não terem aquele sinal de motilidade gastrintestinal (“estômago roncando”), mesmo assim apresentam desejos!
Essas pessoas apresentam estados normais de fome e saciedade mesmo na ausência do estômago, o que demonstra uma contribuição significativa dos componentes cognitivos da fome (motivacional/afetiva), ou seja, sinais de fome ALÉM do estômago.
Por fim, vale ressaltar que os aspectos sensoriais também influenciam: quanto mais opções de comidas há no ambiente, mais o indivíduo quer obter de todas aquelas opções. É visto que há uma redução na percepção de saciedade quando há estímulos distintos presentes no ambiente, que também caracterizam uma recompensa (“saciar a diversidade ao invés da quantidade”).
O comportamento de abordagem nem sempre depende do estado de fome, mas sim do ambiente e da maneira que esse indivíduo se condicionou ao ambiente. Tendo em vista tudo isso, é inegável que aumentar a tolerabilidade do indivíduo ao desconforto é o “ponto chave” para conseguirmos manter o processo sem que haja as expectativas de prazer que ele tinha antes com os alimentos que ele consumia!
Consequentemente, é difícil, na prática, dissociar a fome “fisiológica” da fome “emocional”, já que somos seres movidos a emoções!